Enquanto há 97 PMs do RJ mortos em 2017, as mortes provocadas pela polícia são muito maiores.

Entre janeiro de 2016 e março de 2017, ao menos 1.227 pessoas foram mortas pela polícia no Estado do Rio de Janeiro. A cada dez mortos, nove são negros ou pardos. Ao todo, nesse período, foram mortas 581 pessoas identificadas como pardas, 368 negros e 141 brancos. Não há informações sobre o perfil racial de 137 casos. Apenas quatro são mulheres.

Nacional | Negros - 21 de agosto de 2017

Entre janeiro de 2016 e março de 2017, ao menos 1.227 pessoas foram mortas pela polícia no Estado do Rio de Janeiro. A cada dez mortos, nove são negros ou pardos. Ao todo, nesse período, foram mortas 581 pessoas identificadas como pardas, 368 negros e 141 brancos. Não há informações sobre o perfil racial de 137 casos. Apenas quatro são mulheres.

Os números, compilados pelo ISP (Instituto de Segurança Pública) com base em boletins de ocorrência da Polícia Civil, também mostram um grande número de jovens mortos – dos 1.227 casos, metade tem até 29 anos e 108 pessoas tinham 18 anos ou menos. Cerca de 22% dos casos ocorreram em “morros ou favelas”. O número de mortes em comunidades, no entanto, pode ser ainda mais alto, já que a maioria das ocorrências – 817 – descreve o local do fato apenas como “via pública”. A maior parte das mortes ocorreu na cidade do Rio de Janeiro (619), na Baixada Fluminense e na região metropolitana, em especial nas cidades de Duque de Caxias e São Gonçalo, com 106 e 126 registros, respectivamente.

No caso da capital, as mortes se concentram nas zonas norte e oeste da cidade. Entre os bairros com mais ocorrências destacam-se Santa Cruz, Pavuna, Anchieta e Costa Barros. Na zona sul, foram registradas 14 mortes, 1% do total de mortes em todo o Estado. E, mesmo entre este 1% de mortes na zona sul, metade (7) ocorrem em favelas da região.

Ou seja, o risco de morte, a insegurança e a violência no RJ não são um problema igual para todos, nem sequer parecido. O caos, o medo e a violência são concentrados sobre um público muito bem identificado: pobres de favelas, quase todos pretos e a imensa maioria jovem. Por isso, não é nenhum exagero definir a situação como a de um extermínio da população negra e pobre no Brasil, em especial no RJ.

Mortes seguem perfil de assassinatos no Brasil

Os números repetem o perfil das mortes violentas no Brasil no geral. O país teve um número absurdo de 56.000 pessoas assassinadas 2012! Um número que era semelhante nos anos anteriores e tende a ter sido mantido ou crescido nos anos posteriores. Pois, destes 56 mil assassinatos em 2012, de acordo com a Anistia Internacional, 77% eram jovens negros, entre 15 e 29 anos. A polícia é a maior responsável por estas mortes. A PM não investiga, já que isso fica a cargo da Polícia Civil, e vai “mostrar serviço” onde ela possa encontrar alguém e não precisar de um inquérito nem de uma investigação. Então, os policiais privilegiam as ações em flagrante e na periferia, onde não há recursos das vítimas para contratar advogados, onde a OAB e a imprensa não têm interesse de denunciar e onde podem plantar armas e drogas e forjar “resistências” dos que são mortos pelas costas, ajoelhados ou com tiros na cabeça, em execuções sumárias.

Nas áreas ricas, em que os crimes são do colarinho branco, estupros por parte de homens com dinheiro, tráfico de drogas com entrega por telefone, etc., seria necessário um inquérito e querer investigar. Aí, praticamente não existem ocorrências da PM. Do governo do estado do RJ e da cúpula da PM, a justificativa é sempre a mesma: a “guerra” contra o tráfico.

Uma grande farsa, já que os verdadeiros chefes do tráfico vivem em luxuosos apartamentos na zona sul, e são políticos ou financiadores de campanhas de políticos, além de próximos de juízes e pessoas influentes.

Na “guerra” da PM, são mortos os funcionários mais rasos do tráfico, invariavelmente mais pobres, além de centenas de trabalhadores que nada te a ver com isto, ou crianças, como a menina de 13 anos morta por bala perdida no pátio da escola em que estudava, na favela de Acari, zona norte do Rio. Nem mesmo naquele caso o comandante da PM se pronunciou. O relações públicas da PM chamou de dano colateral: ‘Isso é uma guerra (…) O guerreiro é que sabe o que fazer na hora H'”.

Só que, se fosse mesmo uma guerra, e a morte de crianças fossem explicadas com este desdém, a morte dos “soldados” também deveria ser um mero efeito colateral, ao contrário da vitimização de policiais, que choram suas 97 mortes, mas não tem nada a lamentar das mais de mil mortes que provocaram.

Policiais são mortos fazendo outras atividades

Os dados das causas das 97 mortes de policiais do RJ em 2017 fala por si mesmo:

MORTOS EM SERVIÇO – 21; NA FOLGA – 56; REFORMADOS – 20; TOTAL – 97

Os policiais mortos fora do serviço são a imensa maioria: 78,35%! O que faziam estes policiais que foram mortos? Alguns poucos foram mortos por grupos criminosos que os mataram por serem policiais, mesmo de folga. Outra parte, mais numerosa, foi morta em briga com vizinhos, em discussões na rua, com familiares ou qualquer outra situação em que ser ou não policial não teve nenhuma relevância, a não ser pelo fato de que policiais, por andarem armados, em muitas ocasiões são os que provocam a situação de violência, mesmo em âmbito privado. Foi o caso de uma das últimas mortes de um policial, morto pelo cunhado que é também é um agente de segurança, neste caso da Guarda Municipal.

Mas a grande maioria dos policias mortos fora de serviço morreu em razão de estar trabalhando. Mas não para a polícia nem para o Estado. E sim como seguranças privados de algum comerciante. Os chamados “bicos”, em que policiais ficam de seguranças de boates, padarias, lojas e depósitos são a maior causa da morte de policiais, que morrem como seguranças privados, defendendo o patrimônio particular de empresários, mas são lamentados como mortos “em combate”, cujas famílias recebem indenizações e pensões públicas.

Em serviço, são 21 mortos. São mais de 50 execuções de pobres e negros, sem julgamento nem direito de defesa, para cada morte de policial em serviço, sendo que nem todas elas foram pelas mãos de traficante, aí também devendo ser levado em consideração os acidentes, num helicóptero ou viatura, por exemplo, ou o “fogo amigo”, que pode atingir policiais envolvidos com o tráfico.

Brasil é condenado pela OEA, e só o fim da PM pode impedir mais execuções em massa.

Em maio deste ano, o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por não investigar e punir os responsáveis pelas chacinas de “Nova Brasília”, no Complexo do Alemão, em 1994 e 1995. A sentença destacou a violência policial como uma violação de direitos humanos no Brasil, em especial no Rio. A decisão da Corte estabelece medidas para reduzir a violência policial. Entre elas, determina que, em caso de morte, tortura ou violência sexual decorrentes de intervenção policial em que agentes do Estado sejam suspeitos, a investigação seja feita por um órgão independente.

Para a Human Rights Watch, que lançou no ano passado o relatório “O Bom Policial Tem Medo: Os Custos da Violência Policial no Rio de Janeiro”, os números endossam “o entendimento das autoridades de que execuções extrajudiciais são bastante comuns” no Estado. “O número de mortos por ação policial é muito maior do que o número de baixas na polícia, fazendo com que seja difícil acreditar que todas estas mortes ocorreram em situações em que a polícia estava sendo atacada”, diz a Human Rights Watch.

Mas as chacinas continuam. E os casos de policiais punidos é uma exceção à regra. No geral, a ordem das matanças vem de cima, e é chancelada pelos governos, ignorada pela Justiça e aplaudida pela imprensa. Não há como deter os massacres de pobres sem tomar as armas da burguesia, que utiliza a polícia como um grande grupo de extermínio para praticar “limpeza étnica” nos morros e extermínio dos que ameaçam a paz dos grandes capitalistas.

É preciso acabar urgentemente com a polícia militar, cuja guerra é contra os pobres, e garantir a segurança através de medidas sociais, que gerem emprego, salário, moradia digna e acesso à educação, saúde e lazer. Sem a militarização das favelas e bairros pobres, e como serviços públicos decentes e emprego para todos, a segurança deverá ser feita pelos próprios trabalhadores, através de grupos de auto defesa e segurança popular. A polícia não é bem vinda pelos trabalhadores! E não é a vida dos PMs que tem sido ameaçada: é a vida dos que são vítimas deles.