Barbárie nas cadeias é parte do genocídio a pobres e negros!

A penitenciária de Alcaçuz no RN se transformou na imagem da barbárie, com 26 presos mortos de modo selvagem, depois de uma rebelião provocado pela superlotação da cadeia. Imagens de corpos mutilados, esquartejados e decapitados correram as redes sociais e a imprensa mundial reproduziu os horrores desta tragédia.

Nacional | Negros - 5 de março de 2017

A penitenciária de Alcaçuz no RN se transformou na imagem da barbárie, com 26 presos mortos de modo selvagem, depois de uma rebelião provocado pela superlotação da cadeia. Imagens de corpos mutilados, esquartejados e decapitados correram as redes sociais e a imprensa mundial reproduziu os horrores desta tragédia.

Antes disso, a barbárie tinha sido iniciada em outros dois massacres. No dia 2 de janeiro, o Brasil assistiu ao assassinato e decapitação de, pelo menos, 56 detentos, ligados ao PCC, do presídio Anísio Jobim, em Manaus, aparentemente, por ação da facção conhecida como Família do Norte. 4 dias depois, a vingança foi executada em Roraima, com 33 decapitados e esquartejados.

Depois destes 3 banhos de sangue, vieram as fugas em massa. Em apenas 48h, foram 5 fugas em grande escala, entre a noite do dia 13/01 e  a tarde de 15/01. 132 detentos conseguiram fugir na Bahia (2 fugas), Curitiba, Minas Gerais e na própria Alcaçuz. Na Bahia, houve fugas de 21 presos da carceragem da 4ª Coorpin de Santo Antônio de Jesus; e 17 presos no Complexo Penitenciário de Mata Escura, em Salvador. No Paraná, um grupo armado explodiu a parede da Penitenciária Estadual de Piraquara, na região metropolitana de Curitiba, e 28 detentos conseguiram escapar, além de ter havido 2 mortos pela polícia. Em MG, a fuga ocorreu no Presídio Regional de Ibirité, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, e 10 detentos fugiram.

Todos episódios gravíssimos e que revelam o colapso do sistema penitenciário brasileiro. Mas o pior não foram estes casos. Em Alcaçuz, depois de 26 mortes terríveis e de outros 9 presos foram transferidos para um pronto-socorro por conta de ferimentos graves, os agentes penitenciários simplesmente abandonaram a cadeia e os presos permaneceram por cerca de 2 semanas controlando a prisão, mas em guerra entre si. Facções rivais mantiveram agressões e violência contínua no interior da cadeia, ao mesmo tempo em que, ao menos, outros 56 presos fugiram.

As mortes violentas, as fugas, a corrupção e a continuidade dos crimes de dentro das cadeias (como extorsão, tráfico, sequestros e assaltos a bancos e empresas), são decorrência de um sistema carcerário falido e superlotado, que amontoa uma multidão de presos, em geral pobres, negros e sem sequer terem sido julgados, para que vivam como animais e tenham que se submeter à disciplina e ameaças das facções. Não se consegue sobreviver nestas verdadeiras masmorras modernas sem ter que se associar a uma das facções, transformando responsáveis por pequenos delitos, ou mesmo inocentes, em criminosos muito mais graves.

Explicar as chacinas dentro dos presídios como “guerra de facções” é inverter a causa e consequência. Só há este poder todo das facções, assim como as chacinas e todo o resto, porque os presídios são desumanos, medievais e superlotados. Ninguém se recupera nestes ambientes, e o termo “escola do crime” é justificado no contexto de que são os grandes grupos burgueses criminosos – chamados de facções – que regem o cotidiano dos presídios.

Em breve, um milhão de presos!

Os discursos fascistas que exigem mais prisões e mais tempo na cadeia para qualquer tipo de crime (que os presos “apodreçam” encarcerados), não conseguem entender que é simplesmente impossível prender mais pessoas sem aumentar ainda mais o poder das facções, a corrupção de agentes penitenciários, os privilégios a grandes criminosos e o grau de violência também fora das cadeias.

Depois de cooptar milhares de novos integrantes, as facções cobram seu preço pelas “associações” e exigem que os novos adeptos matem, roubem e seqüestrem para fazer caixa para a organização. Só quem lucra com isto tudo são os políticos e empresários que se relacionam com a criminalidade burguesa (cobrando propina, estimulando milícias, ações judiciais ou investimentos em negócios de lavagem de dinheiro) ou os negócios que a envolvem, vendendo sistemas de segurança, por exemplo.

A massa carcerária no Brasil chegou a um ponto insustentável. Houve um aumento na população carcerária de 267,32% nos últimos 14 anos e, atualmente,  com 622.202 mil presos, é o quarto país com mais presos no mundo, perdendo até mesmo para a Índia, país com mais de 1 bilhão de pessoas. Esses dados são do próprio Ministério da Justiça, e revelam que o Brasil excede a média mundial de 144 presos para cada 100 mil habitantes, tendo mais do que o dobro: 306 pessoas presas para cada 100 mil habitantes.

 

Evolução da População Prisional no Brasil

Para abrigar tanta gente presa, só existem vagas para menos de 400 mil presos. Ou seja, a superlotação carcerária é uma bomba pronta para explodir, pois faltam 250.318 vagas no sistema penitenciário. E não é porque se tenha centenas de milhares de criminosos violentos.

O crime que mais leva pessoas para cadeia é o tráfico de drogas. 28% dos brasileiros estão no cárcere em razão da lei de drogas, seguido de acusados ou condenados por roubo (25%) e furto (13%). Isso significa que, se as drogas fossem legalizadas e controladas pelo Estado, como no vizinho Uruguai, praticamente apenas esta medida já acabaria com a superlotação em todas as cadeias, reduzindo quase 175 mil presos. Ao todo, 2/3 de todos os presos estão na cadeia por crimes que não deveriam existir ou que são de baixo poder ofensivo, e poderiam ter penas alternativas.

Quem brada contra a legalização das drogas ou as penas alternativas, teria que defender a canalização de bilhões de reais para construir dezenas de novos presídios, e para uma enorme estrutura para mantê-los, que sairiam da saúde, educação e até mesmo da segurança pública. Ou isso, ou aceitar que a situação das cadeias vai piorar ainda mais, e isso vai terminar por atingir a vida de todos os trabalhadores fora das cadeias.

Em maio de 2006, por exemplo, o PCC, principal facção criminosa do país, anunciou uma “retaliação” a medidas tomadas pelo governo de São Paulo, e a capital paulista se transformou em um campo de tiro ao alvo. Morreram mais de 500 pessoas, entre policiais, suspeitos de tráfico e pessoas atingidas no meio do fogo cruzado.

Sem que nada mude, chegaremos a mais de 1 milhão de presos em poucos anos, e isso significará uma massa de recursos financeiros e mão de obra retroalimentando ainda mais os grandes grupos burgueses criminosos.

 

Negros e pobres sendo massacrados

Pessoas negras (pretas e pardas) são maioria nas cadeias brasileiras. Segundo o estudo do Ministério da Justiça, 61,6% dos presos pertencem a esse grupo. Já entre o conjunto dos brasileiros, pretos e pardos são 53,6%. Além de cor, os números também mostram que os presos têm menor escolaridade que a média da população. 75% dos presos só estudaram até o fim do ensino fundamental, e só 9,5% concluiu o ensino médio. Já na população brasileira, 32% terminaram o ensino médio, de acordo com dados de 2010 do IBGE.

Estes dados mostram que existe uma rotina, em aprisionar e retirar a liberdade de negros, pobres e pessoas com menos estudo. E a violência a que são submetidas dentro das cadeias é parte da violência que sofrem fora das prisões. No Brasil, a taxa de homicídios é de 26 para cada 100.000 habitantes (na Espanha, por exemplo, não passa de 0,7%). E o número brasileiro cresce ano após ano. Em 1980, esse mesmo índice era de 11 homicídios. O tráfico de drogas é a principal causa dessa porcentagem, junto com os dados de violência policial. Uma e outra coisa estão intimamente ligadas.

Ao mesmo tempo em que se conhecem as causas da violência, também se conhece o perfil das vítimas: negros e pobres. Exatamente como os que acabam presos e sofrem a violência dentro das cadeias. O racismo mata! O racismo é institucional no capitalismo, e inclui o racismo das polícias, já que negros são abordados por policiais de forma mais violenta do que brancos e são as vítimas habituais de execuções e chacinas promovidas por milicianos e grupos de extermínio.

Enquanto o número de homicídios entre não negros sofreu uma queda de 14,6% entre 2004 e 2014, a taxa de assassinatos de negros e pardos cresceu 18,2%, no mesmo período. Isso significa que, para cada não negro vítima de homicídio no país, 2,4 negros, em média, são assassinados. A questão socioeconômica explica apenas 20% da letalidade entre negros e não negros. Conforme o Censo Demográfico do IBGE, mesmo levando em consideração dados como o bairro de residência da vítima, o grau de escolaridade e o estado civil, só o fato de ser negra aumenta em 21% a chance de sofrer homicídio.

Esta realidade não pode ser resolvida apenas com mais cadeias sendo construídas, e muito menos não construindo nada e deixando com que o massacre à juventude pobre e negra prossiga. É urgente acabar com a Polícia Militar, além de legalizar as drogas, multiplicar as penas alternativas e, mais do que qualquer outra medida, garantir emprego, saúde e educação ao conjunto da classe trabalhadora, expropriando bancos, latifundiários e grandes empresários, que mantêm a população inteira vítima de sua exploração e cada vez mais submetida a serviços precários, miséria e violência.

A solução para o problema das cadeias passa por medidas a serem tomadas bem longe delas, onde, realmente, se concentra a riqueza e o poder político.