A validade do Marxismo

Dar às coisas seus nomes verdadeiros é um processo indispensável para compreender corretamente a realidade e, principalmente, para intervir sobre ela. Analisar e caracterizar um movimento, um governo ou qualquer outro processo ou instituição exige um método científico, cujo erro de diagnóstico, como no caso de um paciente doente, certamente levará a um erro do tratamento; neste caso, da política. Porém, ao contrário dos marxistas, para quem a política decorre da análise material da estrutura das classes, da infraestrutura e da superestrutura, para os idealistas, incluindo aí os reformistas em primeiro lugar, as frase de efeito, os termos bombásticos e os conceitos usados sem critério, a bel prazer de seus interesses e da sua propaganda, deturpam análises e conduzem a políticas desastrosas.

Nacional - 20 de janeiro de 2019

As lições sobre o pensamento reformista, que banaliza e deturpa as noções sobre socialismo e fascismo.

                Dar às coisas seus nomes verdadeiros é um processo indispensável para compreender corretamente a realidade e, principalmente, para intervir sobre ela. Analisar e caracterizar um movimento, um governo ou qualquer outro processo ou instituição exige um método científico, cujo erro de diagnóstico, como no caso de um paciente doente, certamente levará a um erro do tratamento; neste caso, da política. Porém, ao contrário dos marxistas, para quem a política decorre da análise material da estrutura das classes, da infraestrutura e da superestrutura, para os idealistas, incluindo aí os reformistas em primeiro lugar, as frase de efeito, os termos bombásticos e os conceitos usados sem critério, a bel prazer de seus interesses e da sua propaganda, deturpam análises e conduzem a políticas desastrosas.

                O principal termo banalizado e esfarrapado pelos reformistas, há mais de um século, é o socialismo. Partidos de direita se dizem socialistas e aplicam ataques aos trabalhadores no mundo inteiro, desde os primeiros anos do século 1900. A tal ponto os oportunistas, intitulados socialistas, eram inimigos do verdadeiro socialismo, que, depois quase unanimemente votarem a favor da 1a Guerra Mundial, em 1914, estes “socialistas” levaram os bolcheviques russos, espartaquistas alemães e alguns outros socialistas de fato a romperem com a 2a Internacional Socialista e construírem a Internacional Comunista. A qual, além da mudança de nome, de programa e de métodos, tinha como um de seus critérios de composição obrigatórios que os partidos a ela filiados se chamassem comunistas, devido ao desgaste e desmoralização do termo socialista naquele momento. Mais adiante, os crimes de Stálin e de seus comparsas levaria a uma crise da nomenclatura também do comunismo. Mas voltemos ao socialismo, por enquanto.

                Até mesmo os nazistas se nomeiam como “nacional-socialistas”, apesar de serem completamente capitalistas, na versão mais de direita que existe deste sistema. No Brasil, o Partido Socialista Brasileiro (PSB) e o Partido Popular Socialista (PPS) são burgueses até a medula, já governaram com Itamar, FHC, Lula, Temer e quem mais atacou os trabalhadores. Nos estados, são formados por oligarquias de coronéis, assassinos, corruptos e neoliberais. Na América Latina, o “socialismo do século XXI” foi uma grande farsa usada por governos burgueses como Evo Morales (novo grande aliado de Bolsonaro e do governo fascistóide da Itália), Chávez (e agora pelo ditador Maduro) e outros para perseguir ativistas sociais e socialistas combativos.

                Mas, como dissemos sobre o stalinismo, a apropriação de nomes e termos para seu sentido oposto vai muito além do “socialismo”. No mundo, os partidos “comunistas” da ex-União Soviética, China e Cuba restauraram o capitalismo, atacam os trabalhadores com planos de direita e perseguem socialistas e comunistas que combatam suas ditaduras capitalistas. Os “democratas” dos EUA financiaram golpes, ditaduras e guerras no mundo todo. Os diversos partidos “nacionalistas” ou “liberais” mundo afora entregam suas riquezas ao imperialismo e retiram as liberdades de seus povos. Chamar a si mesmo de alguma coisa não prova nada a este respeito. Da mesma forma, chamar aos outros de algo impreciso, ou simplesmente absurdo ou demagógico.

                No Brasil, a direita adora chamar os finados governos do PT de “socialistas”, bem como faz com as ditaduras capitalistas da Venezuela e da Nicarágua, que nada têm de socialistas. Convêm a eles desmoralizar o socialismo de verdade (defendido pelos revolucionários, contra Lula, Dilma, Maduro, Ortega, etc.) chamando experiências fracassadas por este nome. Da mesma forma que é útil ao imperialismo atacar a revolução, os trabalhadores e o socialismo apontando para o fracasso dos stalinistas na ex-União Soviética, sendo que a ditadura da casta burocrática deste país era uma barreira ao socialismo verdadeiro, na União Soviética e no mundo inteiro. Nós rechaçamos estes falsos socialistas e comunistas! O socialismo não é isso nem são eles. Eles não nos representam e são lobos em pele de cordeiro. São inimigos da revolução socialistas, que usurparam o nome “socialismo” para serem agentes do capitalismo contra os trabalhadores.

                No entanto, em sentido inverso, assim como os reformistas veem socialismo em si mesmos, em governos de direita, até em ditaduras e em qualquer coisa que lhes convenha, também deturpam e inventam “fascismo” em todo lugar. Maduro fechou o Congresso, rasgou a própria Constituição que aprovou junto com Chávez, prendeu juízes, cassou opositores, executou sindicalistas e disparou contra manifestantes inúmeras vezes, matando mais de 200 pessoas em poucas semanas. Tudo muito similar ao que seria característico de um governo fascista. O que dizemos que não é, embora tenha semelhanças com um regime fascista… O que há na Venezuela é uma ditadura; nem fascismo, mas tampouco democracia-burguesa! Isso é uma caracterização científica, sem exageros ou xingamentos; é uma ditadura por haver elementos que comprovam esta afirmação. No entanto, a esquerda reformista (que muitas vezes nem esquerda é…) denuncia como fascista o que não chega nem perto disso; um governo qualquer dentro do sistema capitalista, quando reprime uma greve, por exemplo.

                Beto Richa, governador do Paraná, reprimiu de forma truculenta manifestações de servidores. Foi chamado de fascista quase em uníssono por anos! Um governo burguês agredindo violentamente professores desarmados é algo gravíssimo. Mas que já ocorreu sob todos os maiores partidos do Brasil, em todos ou quase todos os estados do país. Isso não caracteriza um governo como fascista! As mesmas definições histriônicas, que beiram o chilique e são demagogia barata, foram feitas com Eduardo Cunha, Temer, Sérgio Cabral, Alckminn, etc. O absurdo é que, depois, para justificar o voto em Haddad no 2o turno das eleições de 2018, precisaram dizer que Bolsonaro é que era fascista e que todos os demais, apesar de serem de direita, eram democratas.

                Esta nova versão, de que Bolsonaro era a encarnação do fascismo e nada antes foi sequer parecido às atrocidades que ele faria caso eleito, foi necessária para provar que Bolsonaro não seria “mais um” inimigo, ou mais um “fascista” como eles mesmo haviam tratado dezenas de outros polítcos burgueses antes. Bolsonaro seria “o fascista”, o “Bolsonazi”, um novo “Hitler”, chefiando um governo fascista, uma ditadura, aonde só restaria o exílio, para fugir dos inevitáveis assassinatos em massa, encarceramento de multidões, fechamento de sindicatos e do Congresso, e dos tanques massacrando tudo e todos.

                Os reformistas são tão ridículos chamando a si mesmo de socialistas (ou inventando governos “socialistas” onde há neoliberalismo ou até mesmo ditaduras) como quando chamam a qualquer adversário burguês de fascista. A situação chega ao cúmulo quando eles mesmos se aliam ao “fascista” Rodrigo Maia na Câmara dos Deputados e a tantos outros “fascistas”, descritos assim quando eram seus adversários, mas que viram “democratas” quando são aliados. O uso do termo fascista como um simples xingamento, sem qualquer critério sério, é tão nocivo e lunático como o que fazem os setores de extrema direita, que acham que todos são comunistas e que tudo é uma conspiração comunista. Não são simples erros ou análises descabidas. São análises-justificativas para fortalecer algum discurso que se queira massificar, e que levam a tragédias!

                Quando se trata de uma criança que tem medo de um monstro embaixo da cama, ou de um adulto que tem medo de sair à rua por causa dos germes no ar, ou de alguém que não come fora de casa por sempre imaginar estar sendo envenenado; todos sabem que é um medo irracional, e que ou se espera que acabe, no caso da criança, ou exige um tratamento, no caso dos adultos. Da mesma forma, com qualquer outro medo descabido, é necessário cair na realidade, sob pena de viver limitado e/ou cair no ridículo. Há germes que matam, há comidas envenenadas e há governos fascistas. Mas ver fascismo em todo lugar, ou atribuir fascismo a declarações públicas é tão sem sentido quanto achar que há veneno em todas as comidas ou que há socialismo e marxismo em todos os lugares, por haver gente que assim se declara na internet, mesmo que não exista ação nenhuma neste sentido.

                A dificuldade dos reformistas em sustentar seus discursos catastróficos é que a realidade supera qualquer ideia abstrata e teoria mirabolante. Quando eles diziam que vivíamos um enorme refluxo, veio o levante popular de 2013. Voltaram a dizer isso nos anos seguintes e milhões saíram às ruas, derrubaram sua presidente neoliberal e construíram greves gerais, greves como a dos caminhoneiros, ondas de ocupações de escolas pela juventude e um mar de mulheres se mobilizando nas ruas.

                Agora, a anunciada ditadura não veio. Muito menos o fascismo. Bolsonaro tomou posse em meio a uma série de desmentidos, e trata de aplicar os ataques que os governos neoliberais anteriores não conseguiram concluir. Sem exílios, massacres e holocausto, os reformistas mudam o discurso e criam o “fascismo do século XXI”, que seria sem sangue e por meio constitucional, com a manutenção das instituições e eleito pelo voto, sem assassinatos em grande escala, com sindicatos abertos e negociando com o “ditador” Bolsonaro, como a CUT e a CTB já estão tratando de fazer. É o cumulo! Tão vergonhoso como distorcer o termo socialismo até não haver mais nenhuma seriedade em sua aplicação, é converter o termo fascismo em uma piada deste tipo, sem nenhuma graça.

                Chamar um governo neoliberal de fascista serve ao que e a quem? Serve a 3 propósitos: a) ao fascismo de verdade, que hoje não existe, mas, se um dia se tornar uma possibilidade real, verá seu caminho facilitado, de tão desmoralizado que ficou o termo;  b) ao governo Bolsonaro, pois os trabalhadores normais escutam estas “acusações” e ficam ainda com mais ódio do PT, depois do que ele já roubou e destruiu a economia, pois sabem que os problemas do governo são outros; c) em menor escala, ao bloco burguês PT/PCdoB/PSOL, que perde credibilidade com uma maioria, mas ganha a fidelidade de uma minoria de apoiadores que caem neste discurso messiânico de “luta contra o apocalipse fascista”.

                Nós, como revolucionários marxistas e materialistas dialéticos, ao contrário, temos que chamar as coisas pelos seus nomes, para que as possamos enfrentar de maneira séria! Fascismo é fascismo, nazismo é nazismo, socialismo é socialismo e revolução é revolução! Sem relativismos! Não existe fascismo ou socialismo do século XXI, nem revolução eleitoral ou o que quer que o valha. Não existe governo para todos, patrões e empregados; nem vai ser por meio de “mudança da mentalidade”, sem revolução nem tomada dos meios de produção e destruição do Estado burguês que mudará alguma coisa.

                O PT é um partido burguês neoliberal, como o PSDB, MDB, PSL, e praticamente todos os demais. Idem o PCdoB. O PSOL é um partido pequeno burguês, com um programa burguês e satélite do PT. Maduro é um ditador capitalista na Venezuela. Isso é dar nome aos bois e chamar as coisas pelo que elas são. Só assim é possível ter uma política correta.

                Quanto a Bolsonaro, ele é um reacionário, inimigo dos trabalhadores, mas à frente de um governo democrático-burguês neoliberal. É assim que deve ser enfrentado, derrotado e derrubado! Pintar seu governo como uma ditadura, além de insano, é uma maneira de defender a democracia-burguesa, como se ataques a direitos democráticos e violência contra movimentos sociais não pudessem ser feitos por meio dela. É uma concepção oportunista ao extremo! Além disso, se o novo governo fosse similar a uma ditadura, seria uma irresponsabilidade chamar uma Greve Geral neste momento, ou mesmo atuar com sindicatos abertos, militantes fora da clandestinidade, etc. A tragédia de ver militantes emigrando, fugindo, evitando as ruas, fechando entidades e interrompendo manifestações só não ocorre porque nem mesmo os porta-vozes desta tese absurda a levam a sério.

                Nosso enfrentamento a Bolsonaro não pode mais esperar! É urgente sair às ruas e romper a trégua que a “esquerda” está lhe dando, assim como romper o medo de lutar que estes mesmos setores querem incutir na massa com a repetição descabida do fantasma do fascismo. Os trabalhadores precisam atropelar estas direções traidoras e organizar grandes enfrentamentos contra o governo! Nossa classe tem uma força enorme e a correlação de forças nos permite derrotar os patrões e governos!

Retomar o marxismo revolucionário! Abaixo o relativismo, o reformismo e o culturalismo pequeno burguês.

                Se a direita ideologicamente mais reacionária cumpriu algum papel até agora, não foi o de mudar o regime político do país nem alterar significativamente nada da política; e sim o de retomar a discussão sobre o marxismo e o comunismo. Até esta direita reconhece o marxismo como seu maior inimigo, e o comunismo como o sistema que pode acabar com seus privilégios. Nisto, eles estão cobertos de razão. Só a destruição do capitalismo por meio de uma revolução socialista – tese básica do marxismo – pode impedir os ataques aos trabalhadores, evitar um futuro fascista e acabar com a exploração, o machismo, o racismo e a LGBTQ+fobia.

                Mas, se até os inimigos de classe mais violentos dos trabalhadores sabem que o marxismo como teoria, a revolução socialista como método e o Estado operário rumo ao comunismo como sistema, são o que pode destruir sua exploração, como é que, entre a “esquerda”, há cada vez menos grupos e “intelectuais” que defendam isto?

                O descompasso entre o avanço da crise capitalista, a cada vez mais radicalizada luta de classes e a necessidade de tomar o poder, de um lado; e a crise de direção, o oportunismo, o revisionismo e as traições da maioria da esquerda, por outro lado; nunca foi tão grande.  Há um abismo entre um mundo em que a luta de classes implora por uma saída revolucionária e uma esquerda que foge e renega a revolução com todas suas forças.

                A maioria da “esquerda”, seja ela militante do PT, PCdoB, PSOL e, em menor escala, PSTU; ou orbitando estes partidos através de grupos anarquistas, autonomistas, grupos identitários (feministas, LGBTQ+, anti racismo) ou culturalistas renegam a luta de classes! Renegam a necessidade de uma revolução socialista com a necessidade da tomada do poder de forma violenta, renegam a ditadura do proletariado (que significa a democracia para os 99% que produzem), renegam o protagonismo do proletariado como classe para acabar com as opressões, renegam a necessidade indispensável de haver uma direção revolucionária da luta e organismos de duplo poder da massa.

                A imensa maioria da “esquerda” virou as costas para o marxismo e para a bandeira vermelha muito antes dos ataques de Bolsonaro, MBL ou Olavo de Carvalho. Foi uma rendição sem luta, espontânea. Estes setores se passaram alegremente ao campo da contra-revolução e à defesa do capitalismo, de suas instituições, de seu “Estado de direito”, de sua “democracia como valor universal” e do pacifismo burguês ou pequeno-burguês! Eles não apenas não acreditam em revolução nenhuma, como combatem os que a defendem de modo coerente, os atacando com calúnias de sectários e ultra esquerdistas. São como os inimigos reformistas que Marx, Lênin, Tróstky e Rosa Luxemburgo também tiveram que enfrentar; e que muitas vezes até se cansavam de tanto falar em socialismo, mas que não passava de um “socialismo em dias de festa”.

                O discurso pós-moderno impregnado nas universidades praticamente eliminou o marxismo do meio acadêmico. O culturalismo e o identitarismo rebaixaram a luta fundamental e imprescindível das mulheres, negros e LGBTQ+ pelo fim da exploração e da opressão, como vanguardas da revolução que seus integrantes proletários devem ser, pela destruição do capitalismo; para transformar-se numa luta meramente por reformas, afirmação e “cidadania” capitalista.

                O eleitoralismo converteu um contingente enorme de militantes muito capazes em cabos eleitorais a cada 2 anos, um exército de soldados sem crítica, a serviço de parlamentares e dirigentes completamente adaptados à democracia-burguesa, quando não já convertidos em burgueses. O pacifismo, por sua vez, faz “socialistas” tremerem de medo de armas nas mãos da população, e defende o monopólio das armas e da violência nas mãos do Estado burguês, que para eles é o único possível, e que deve ser disputado. É um vendaval oportunista, de revisionismo e de traições incalculável!

                Assim como esta esquerda da bandeira laranja assusta seus fiéis com o medo de um fascismo, hoje imaginário; a direita no poder assusta seus igualmente iludidos fiéis com o medo do marxismo e do comunismo, que, salvo pequenos grupos e bravos militantes, já foi jogado no lixo e abandonado por quase todos. Na era dos “fakes”, esta é a disputa mais fake que poderia existir… No lugar desta falsa polarização, é preciso avançar na polarização de verdade: trabalhadores contra patrões! Oprimidos contra opressores! Explorados contra exploradores! Revolucionários contra todos os que defendem este sistema de morte que é o capitalismo, sejam eles declarados de esquerda ou de direita.

                O reformismo nunca foi nem nunca será capaz de resolver qualquer problema dos trabalhadores e só protege o capitalismo asfaltando o caminho da barbárie. 170 anos depois d’O Manifesto Comunista, um espectro ainda ronda a Europa, a América, a Ásia, a África e a Oceania. O espectro do comunismo! Que o digam as revoluções árabes, a revolução curda, as greves na Europa, as lutas na França, as insurreições na África, os levantes na América Latina, as mobilizações de massa nos EUA. É hora de organizarmos esta saída!